segunda-feira, 28 de novembro de 2011


Juiz que combateu a máfia italiana ‘ensina’ o caminho

Angeli
O Brasil vive um momento especial na economia. No ano passado, ultrapassou a Itália no ranking das maiores economias do mundo. Assumiu a sétima posição.
Beneficiado pela ruína da Europa e pela sobrevalorização do Real, o PIB brasileiro está na bica de deixar para trás também o do Reino Unido.
O FMI e outros organismos dão de barato que, enquanto a zona do euro penetra o caos, o Brasil ascende rumo à sexta posição na tabela das economias mais pujantes.
A ascensão recomenda perseverança. De resto, expõe velhas mazelas e impõe novos desafios. Desafios econômicos e políticos.
A despeito dos avanços, o Brasil continua sendo uma das nações mais desiguais do mundo. E não perdeu a aparência de paraíso de criminosos.
Há três meses, a juíza Patrícia Acioli, que combatia as milícias no Rio de Janeiro, foi passada nas armas por policiais.
O noticiário está apinhado de escândalos constrangendores –um se sucedendo ao outro, num ritmo alucinante.
A roubalheira, por generalizada, investe contra o bolso do contribuinte nos municípios, nos Estados e em Brasília. O que fazer?
De passagem por São Paulo, um juiz italiano que participou da célebre ‘Operação Mãos Limpas’ ofereceu alguns ensinamentos.
Chama-se Roberto Scarpinato. Ao lado de outro magistrado, Giovanni Falcone, combateu a máfia siciliana e a corrupção política, nas décadas de 80 e 90.
Falcone teve destino semelhante ao da juíza Patrícia Acioli. Num atentado de 1992, a máfia eliminou-o. Mas a Itália dobrou os joelhos do crime organizado.
As investigações desbarataram também uma teia de fraudes partidárias. Giulio Andreotti, primeiro ministro sete vezes, foi sentenciado a 24 anos de prisão.
Em conversa com o repórter Bruno Bocchini, o juiz Roberto Scarpinato realçou o principal segredo do êxito. Na Itália, a Polícia Judiciária é subordinada ao Judiciário:
“O grande sucesso da Itália é que a magistratura do Ministério Público, além da independência, tem todo o controle da atividade policial…”
“…E tem a possibilidade de investigar e de buscar as autorias e a materialidade dos crimes independentemente.”
No Brasil, como se sabe, Polícia Judiciária deve obediência ao Executivo. As polícias civis são subordinadas aos governadores. A Polícia Federal, ao presidente de plantão.
Scarpinato iluminou outros segredos: criou-se na Itália um corpo de magistrados policiais especializados no combate a organizações mafiosas e ajustou-se a legislação:
“Não se pode combater o crime organizado com as mesmas leis […] que valem para uma associação deliquencial simples, como quadrilhas e bandos, por exemplo…”
“…Para se combater um cancro, não se pode usar o mesmo remédio [usado] para se combater um problema estomacal comum.”
No mais, disse Scarpinato, entrou em cena a opinião pública italiana. O magistrado recordou uma passage interessante:
“O ministro do Interior do governo anterior, que é o ministro da Segurança Pública, preparou um ato para tirar a escolta de alguns juizes…”
“…Houve grande pressão em contrário da opinião da pública, e ele teve que mudar de posição…”
“…O povo […] não aceitaria nunca, e faria pressões ao saber que um magistrado ficou sem escolta. Um crime como o da juíza Patrícia Acioli seria inaceitável hoje na Itália.”
Quer dizer: tomado pelo PIB, o Brasil ultrapassou a Itália. Medido pelo estágio civilizatório, apesar do 'efeito Berlusconi', ainda está muito longe.

Escrito por Josias de Souza às 19h57

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